O ativista queniano Boniface Mwangi, conhecido por seu histórico de mobilizações de rua, será apresentado à Justiça sob a acusação de “facilitação de atos terroristas” e posse ilegal de munição, relacionada aos protestos antigoverno de 25 de junho que deixaram ao menos 19 mortos no Quênia.
A Direção de Investigações Criminais do país informou que, durante operações realizadas no domingo, agentes recolheram celulares, um laptop e cadernos na residência de Mwangi em Lukenya, área periférica da capital Nairóbi. No escritório do ativista, situado na região central da cidade, foram apreendidos discos rígidos, computadores, cápsulas de gás lacrimogêneo e uma munição de festim.
O processo teve início após manifestação popular na qual, segundo a Comissão Nacional de Direitos Humanos do Quênia (KNCHR, órgão financiado pelo Estado), 19 pessoas morreram e centenas ficaram feridas em confrontos entre manifestantes e policiais. Diversos estabelecimentos também sofreram danos materiais durante a jornada de protesto.
Na ocasião, o ministro do Interior, Kipchumba Murkomen, classificou as mobilizações como “terrorismo disfarçado de dissidência” e um “intento inconstitucional” de alterar o governo. As declarações alinham-se à denúncia formal contra Mwangi, que rejeita qualquer envolvimento com atividades terroristas e declarou em publicação na rede social X: “Não sou terrorista”.
As manifestações não cessaram depois de junho. A KNCHR contabiliza outras 38 mortes em protestos registrados no início de julho. Desde junho do ano passado, a entidade soma mais de 100 óbitos em diferentes ondas de mobilização, período em que a polícia tem sido reiteradamente acusada de empregar força excessiva para dispersar a população.
O Ministério Público sustenta que Mwangi exerceu papel central na organização dos atos, motivo pelo qual responde por facilitação de terrorismo. A legislação queniana prevê penas severas para crimes enquadrados nessa categoria, incluindo longas condenações em regime fechado. Ainda não há data oficial divulgada para a leitura formal da acusação, mas a expectativa é de que o caso seja encaminhado rapidamente ao Tribunal Superior de Nairóbi.
A detenção ativou reação imediata de entidades de direitos humanos. Um coletivo de 37 organizações divulgou nota conjunta qualificando as alegações contra Mwangi como “infundadas” e enxergando na ação policial “a mais recente escalada de uma repressão sistemática que já levou centenas de jovens quenianos a prisões sob acusações fabricadas de terrorismo”. O grupo argumenta que a criminalização de protestos pacíficos representa ameaça direta ao espaço democrático do país.
Figuras políticas também se pronunciaram. James Orengo, ex-senador e governador do condado de Siaya, descreveu como “absurdo” o enquadramento do ativista e de outros participantes dos protestos na lei antiterrorismo, afirmando que os jovens demonstraram “alto nível de consciência política”. Apesar das críticas, o governo mantém a posição de que os protestos excederam limites constitucionais e configuraram ameaça à segurança pública.
Boniface Mwangi já enfrentou múltiplas detenções desde que emergiu como liderança em movimentos cívicos no início da década passada. Em maio deste ano, foi preso na Tanzânia ao lado da ativista ugandense Agather Atuhaire, quando ambos acompanhavam o julgamento por traição do oposicionista tanzaniano Tundu Lissu. Após a libertação, relataram sequestro, tortura e violência sexual, abrindo processo na Corte de Justiça da África Oriental.
Nos eventos que originaram a atual acusação, protestantes se mobilizaram contra políticas governamentais e aumento de tributos. O presidente William Ruto enfrenta índices de reprovação elevados e tem sido alvo de críticas pela condução econômica. A oposição alega que a carga tributária agrava o custo de vida, já pressionado por inflação e desemprego.
Organizações internacionais acompanham o caso e manifestam preocupação com o que classificam como uso ampliado de leis antiterrorismo para conter dissenso em países do Leste da África. Embora não haja sanções externas em debate, diplomatas observam possíveis repercussões sobre a imagem do Quênia como parceiro regional de segurança.
Até o momento, não foram divulgadas provas de que Mwangi possua ligação com grupos armados ou financiamento de ações violentas. A defesa afirma que os artefatos apreendidos em seu escritório, como os cilindros de gás lacrimogêneo, foram coletados em protestos anteriores e guardados como evidência de alegada brutalidade policial. A promotoria, porém, não comentou essa linha de argumentação.
O desenrolar do processo contra Boniface Mwangi tende a servir de termômetro para as liberdades civis no país, enquanto movimentos sociais prometem continuar mobilizações. Paralelamente, familiares das vítimas fatais dos protestos aguardam investigações completas sobre as circunstâncias das mortes e eventual responsabilização de agentes de segurança.

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