Crise de ansiedade altera atividade cerebral e provoca reações físicas intensas

A ansiedade é o transtorno mental mais prevalente no mundo, afectando perto de 300 milhões de pessoas, segundo a Organização Mundial da Saúde. Quando evolui para uma crise, o cérebro activa um conjunto de mecanismos que reproduzem a resposta a uma ameaça real, mesmo que não exista perigo imediato.

Alarme cerebral e cascata hormonal

O processo inicia-se na amígdala, estrutura responsável por identificar sinais de risco. Durante a crise, esta região entra em hiperatividade e emite um alerta que mobiliza outras áreas cerebrais. O hipotálamo recebe o sinal e acciona o sistema nervoso autónomo, preparando o organismo para lutar ou fugir.

Paralelamente, o córtex pré-frontal — encarregado do raciocínio lógico — reduz a actividade, o que dificulta a avaliação racional da situação e amplia a sensação de descontrolo. O hipocampo, que interpreta o presente com base em memórias, pode reforçar a percepção de perigo ao recuperar experiências negativas semelhantes.

Esta sequência desencadeia uma libertação maciça de adrenalina e cortisol. As hormonas elevam a frequência cardíaca, aumentam a pressão arterial e mantêm o estado de alerta. O corpo reage como se estivesse diante de um risco físico iminente, ainda que a origem seja um gatilho emocional.

Sintomas físicos e impacto no circuito de recompensa

O predomínio do sistema nervoso simpático explica manifestações como taquicardia, falta de ar, sudorese, tremores, tensão muscular, náuseas ou tonturas. Estas respostas destinam-se a optimizar a sobrevivência em cenários de perigo, mas tornam-se desconfortáveis quando não existe uma ameaça concreta.

Durante o episódio, o circuito de recompensa também sofre alterações. Estudos indicam uma redução da actividade dopaminérgica, o que diminui a capacidade de sentir prazer e dificulta a aprendizagem de que o contexto é seguro. A quebra na produção de dopamina acentua o mal-estar e prolonga o estado ansioso.

Importa salientar que o sistema límbico — onde se integra a amígdala — não distingue entre ameaças reais e imaginadas. Assim, situações quotidianas como falar em público ou enfrentar um prazo apertado podem desencadear a mesma reacção neurofisiológica provocada por um assalto.

Consequências de crises repetidas

Embora um episódio isolado tenda a passar sem deixar sequelas, crises frequentes podem provocar alterações estruturais mais duradouras. Nos indivíduos com transtorno de ansiedade, a amígdala permanece cronicamente hiperativa e a ligação com o córtex pré-frontal enfraquece, dificultando a desactivação do alarme interno.

O stress contínuo está associado a neuroplasticidade mal-adaptativa. Investigações referem que pode ocorrer retracção de neurónios no hipocampo e no córtex pré-frontal, comprometendo memória e regulação emocional. Em simultâneo, há expansão de ligações na amígdala, que fortalece as respostas de medo e reforça o ciclo ansioso.

Estas mudanças estruturais tornam o cérebro mais susceptível a novos episódios e dificultam a recuperação espontânea. Identificar os sinais precocemente e recorrer a acompanhamento especializado são medidas essenciais para quebrar este ciclo e restabelecer o equilíbrio neuroquímico.

Por que o corpo reage com tanta intensidade?

Do ponto de vista evolutivo, a resposta de luta ou fuga confere vantagem na sobrevivência. A adrenalina optimiza o fluxo sanguíneo para músculos e cérebro, enquanto o cortisol garante energia imediata ao libertar glicose. Na vida moderna, porém, a mesma reacção pode ser desencadeada por factores psicológicos, sem saída física para a tensão gerada.

O desfasamento entre a resposta biológica e a natureza do estímulo explica a intensidade dos sintomas. Quando o evento passa e os níveis hormonais se normalizam, o organismo tende a recuperar. No entanto, se o estímulo se repete ou se prolonga, a activação constante provoca desgaste físico e emocional.

Sinais a vigiar e procura de ajuda

Batimentos cardíacos acelerados, sensação de aperto no peito, tremores persistentes e medo intenso sem causa aparente são indícios de que o sistema de alarme pode estar hiperactivo. Caso as crises se tornem frequentes, especialistas recomendam avaliação clínica para excluir problemas cardíacos e iniciar o tratamento adequado, que pode envolver psicoterapia, técnicas de respiração e, em alguns casos, medicação.

Reconhecer a crise como uma resposta fisiológica, e não como falha pessoal, é o primeiro passo para interromper o ciclo. Estratégias de gestão de stress, acompanhamento psicológico e actividade física regular têm mostrado eficácia na redução da hiperactividade amigdalar e na restauração da conectividade com o córtex pré-frontal.

A compreensão dos mecanismos cerebrais envolvidos ajuda a desmistificar a crise de ansiedade e sublinha a importância de um diagnóstico atempado para evitar alterações estruturais que perpetuem o transtorno.

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