Brasil inaugura no Paraná a maior biofábrica de Aedes aegypti do mundo

A cidade de Foz do Iguaçu (PR) recebeu, no sábado (19), a Wolbito do Brasil, estrutura apontada como a maior biofábrica do planeta dedicada à produção do mosquito Aedes aegypti com a bactéria Wolbachia. O empreendimento resulta de uma parceria entre o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP) e o World Mosquito Program (WMP), programa internacional que desde 2014 testa o método no país.

Com capacidade estimada para gerar até 100 milhões de ovos por semana, a unidade pretende ampliar de forma significativa a liberação controlada desses insetos em municípios definidos pelo Ministério da Saúde, escolhidos de acordo com os índices de arboviroses, grupo de doenças que inclui dengue, zika e chikungunya.

Como o método funciona

O procedimento conhecido como Método Wolbachia consiste em inocular mosquitos do tipo Aedes aegypti com a bactéria Wolbachia pipientis, presença natural em mais da metade dos insetos do mundo. Introduzida no vetor da dengue, essa bactéria ocupa o interior das células e dificulta a multiplicação dos vírus que causam as três doenças. Dessa forma, mesmo que o mosquito pique uma pessoa infectada, a probabilidade de transmitir o patógeno a outro ser humano cai de forma expressiva.

A liberação dos mosquitos é feita em áreas urbanas previamente mapeadas. Quando os insetos contendo Wolbachia cruzam com a população local, a bactéria é passada aos descendentes. Estudos de campo mostraram que, ao atingir determinada frequência, o micro-organismo se mantém na comunidade de mosquitos sem necessidade de reposições constantes, característica que torna o método considerado sustentável e de baixo custo operacional.

Expansão nacional

O Brasil iniciou os testes em 2014, em bairros do Rio de Janeiro e de Niterói. Resultados positivos motivaram a ampliação para Belo Horizonte, Londrina, Foz do Iguaçu, Campo Grande, Petrolina e Joinville. Em 2023, novas liberações estão previstas para o segundo semestre em municípios como Blumenau, Balneário Camboriú, Brasília e Valparaíso de Goiás.

Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que coordena a iniciativa no país, cada R$ 1 investido na estratégia pode gerar economia entre R$ 43 e R$ 549 em tratamentos médicos e custos associados às arboviroses. O cálculo considera despesas com internações, consultas, exames e perda de produtividade dos pacientes.

Produção em larga escala

Na Wolbito do Brasil, o processo de criação obedece a protocolos de biossegurança. Os mosquitos são mantidos em ambientes controlados, onde recebem a inoculação da bactéria e passam por etapas de reprodução que visam garantir alta taxa de transmissão de Wolbachia aos ovos. A capacidade anunciada de 100 milhões de ovos semanais é considerada suficiente para abastecer simultaneamente diversos programas municipais.

De acordo com o IBMP, a fábrica inicia a operação com foco em áreas prioritárias do Ministério da Saúde e deverá expandir a produção à medida que novas parcerias locais forem formalizadas. Não há modificações genéticas envolvidas, apenas a introdução da bactéria, classificada como segura para seres humanos e para o meio ambiente pelos estudos conduzidos até o momento.

Complemento às ações tradicionais

Especialistas alertam que a tecnologia não elimina a necessidade das medidas clássicas de combate ao mosquito, como o descarte correto de lixo, vigilância de recipientes com água parada e campanhas de conscientização. A proposta é atuar de forma complementar, reduzindo a carga viral circulante e, consequentemente, os casos clínicos de dengue, zika e chikungunya.

O Ministério da Saúde acompanha os resultados obtidos em campo e avalia indicadores como número de notificações, hospitalizações e óbitos antes e depois da liberação dos mosquitos. Até o momento, as cidades que participaram das etapas piloto relataram queda expressiva na incidência das três doenças, aspecto que embasou a decisão de investir na produção em escala industrial.

Perspectivas

Com a inauguração da Wolbito do Brasil, o país passa a contar com infraestrutura capaz de atender, em curto prazo, regiões que historicamente enfrentam surtos de arboviroses. Além de ampliar a cobertura, a fábrica poderá servir como centro de pesquisa para novas aplicações da bactéria Wolbachia em outros vetores ou combinações de estratégias.

O cronograma de distribuição dos ovos produzidos no Paraná será alinhado com secretarias municipais e estaduais de Saúde. As liberações ocorrem em ciclos sucessivos, normalmente ao longo de 12 a 16 semanas, período suficiente para que a bactéria alcance prevalência considerável na população de mosquitos local.

O avanço da tecnologia insere o Brasil no grupo de países que adotam soluções biológicas para o controle de doenças tropicais, alinhando-se a experiências registradas na Austrália, Indonésia, Vietnã e Colômbia. A expectativa dos responsáveis é que a combinação entre produção em larga escala, monitoramento epidemiológico e participação comunitária contribua para reduzir o impacto das arboviroses nos próximos anos.

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