BRASÍLIA — A Câmara dos Deputados voltou a funcionar na noite de quarta-feira, depois de um bloqueio de cerca de 30 horas protagonizado por parlamentares aliados de Jair Bolsonaro. O deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) só conseguiu regressar à cadeira da presidência após negociação conduzida pelo seu antecessor, Arthur Lira (PP-AL).
Contexto do protesto
O motim começou na terça-feira, em reacção à prisão domiciliária decretada pelo Supremo Tribunal Federal para o ex-presidente. Deputados da oposição ocuparam as mesas dos plenários da Câmara e do Senado, impedindo qualquer deliberação. Em sistema de revezamento, permaneceram no local durante a madrugada, enquanto a polícia legislativa restringia o acesso às salas a parlamentares credenciados.
Os manifestantes tentavam forçar a direcção do Congresso a colocar em pauta três pontos: anistia a Bolsonaro e aos condenados pelos actos de 8 de Janeiro de 2023, abertura de processo de impeachment contra o ministro do STF Alexandre de Moraes (responsável pela ordem de prisão) e limitações à actuação do tribunal em investigações que envolvem congressistas.
Negociações e desfecho na Câmara
Durante todo o dia de quarta-feira, Hugo Motta, no exercício da presidência da Câmara, manteve reuniões com líderes de partidos, incluindo PL, PT, MDB e União Brasil, à procura de uma solução. De manhã, falou directamente com os líderes da oposição Gustavo Zucco (PL-RS) e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), mas não houve acordo porque Motta recusou-se a agendar a votação da anistia.
À tarde, o presidente interino ameaçou aplicar suspensão de mandato de até seis meses a quem continuasse a ocupar a Mesa. A medida contava com apoio de várias bancadas, mas serviu sobretudo como pressão política. Só depois das 22h00, com a intervenção de Arthur Lira, os manifestantes libertaram o espaço e Motta pôde declarar aberta a sessão de votações.
O retorno do deputado à cadeira foi tenso. Ele levou mais de seis minutos a atravessar a multidão de colegas que bloqueavam o caminho. O deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) chegou a recusar-se a ceder o lugar; apenas após discussão e algum empurra-empurra, e com ajuda do líder do MDB, Isnaldo Bulhões Júnior, Motta alcançou a presidência.
Já sentado, o parlamentar apelou ao respeito pelo regimento interno e pela Constituição: «A oposição tem direito a manifestar-se, mas o plenário não pode ser refém de interesses individuais», afirmou, sublinhando a necessidade de «resgatar a respeitabilidade» da Casa.
Posicionamento do Senado
Do outro lado do Congresso, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), também negociava a desocupação do plenário. Sem sucesso imediato, decidiu marcar para esta quinta-feira uma sessão virtual, assegurando que não permitiria que o funcionamento da Casa fosse travado.

Imagem: noticiasaominuto.com.br
Em nota, Alcolumbre declarou não aceitar «intimidações nem tentativas de constrangimento». Segundo relatos de senadores presentes nas reuniões, o presidente descartou por completo abrir processo de impeachment contra ministros do STF, uma das principais exigências dos bolsonaristas. O senador Cid Gomes (PDT-CE) relatou que Alcolumbre foi categórico: «Não há hipótese de colocar essa matéria em votação, independentemente do número de assinaturas».
A expectativa do Senado é retomar sessões presenciais já na próxima semana, mesmo que persistam protestos. Alcolumbre disse que o plenário «terá de estar livre por bem ou por mal», reforçando que a prerrogativa de pautar o impeachment de membros do Supremo pertence exclusivamente à presidência da Casa.
Possíveis sanções e próximos passos
Embora o acto formal de suspensão não tenha sido publicado, líderes da maioria avisaram que a Câmara pode enviar nomes de deputados ao Conselho de Ética se novos bloqueios impedirem os trabalhos. Motta conta com apoio de partidos de centro e esquerda para aplicar medidas disciplinares, caso considere necessário.
Para já, a ordem do dia na Câmara foi retomada, mas deputados bolsonaristas prometem continuar a pressionar pela anistia e outras pautas. O clima permanece tenso, com receio de novos episódios de obstrução. Nos bastidores, líderes partidários defendem a retomada de negociações, mas rejeitam qualquer debate sob «chantagem».
O episódio expôs a fragilidade do regimento diante de protestos internos, levou ao cancelamento de votações importantes e reacendeu a discussão sobre limites de manifestação parlamentar. A direcção do Congresso quer evitar novos impasses, mas terá de equilibrar a liberdade política dos deputados com o funcionamento das instituições.

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