Uma investigação realizada no Hospital Universitário de Copenhague revela que sessões de realidade virtual podem atenuar a gravidade e a frequência das alucinações auditivas em adultos com esquizofrenia. O ensaio clínico aleatorizado avaliou a terapia Challenge-VRT, baseada na interação entre doentes e avatares que reproduzem as vozes que ouvem, e apontou ganhos significativos após três meses de acompanhamento.
Como decorreu o estudo
O trabalho foi conduzido pelo Grupo de Investigação VIRTU e incluiu 270 utentes seguidos em consultas externas de psiquiatria. Os participantes foram distribuídos em dois braços: um recebeu sete sessões semanais de Challenge-VRT, mais duas de reforço; o outro manteve o tratamento habitual otimizado. Durante cada sessão, terapeutas mediavam diálogos em tempo real entre o paciente e um avatar configurado para reproduzir características da voz alucinatória, com o objetivo de reforçar a autoestima e reduzir o poder atribuído às vozes.
A intervenção foi desenhada como terapia complementar, destinando-se sobretudo aos casos em que a medicação antipsicótica não oferece alívio completo. Estima-se que cerca de 75 % das pessoas com esquizofrenia experienciem alucinações auditivas verbais, e que um terço apresente resistência aos fármacos disponíveis, o que sublinha a necessidade de abordagens alternativas.
Resultados obtidos
Após 12 semanas, o grupo Challenge-VRT registou uma redução média de 12,9 % na gravidade das alucinações e de 14,4 % na frequência das vozes comparativamente à linha de base. Os benefícios mantiveram-se até às 24 semanas, indicando efeito prolongado. A maioria dos participantes tolerou bem o procedimento, embora 37 % tenha relatado agravamento transitório dos sintomas logo após as sessões.
Foram ainda documentados seis eventos adversos graves, incluindo hospitalizações e um episódio de automutilação. Os autores salientam que nenhum desses casos foi atribuído diretamente à realidade virtual, mas defendem monitorização clínica apertada sempre que se adopta a técnica.
Implicações para a prática clínica
Os dados sugerem que a realidade virtual pode funcionar como ferramenta complementar em programas de reabilitação psiquiátrica, sobretudo para doentes com alucinações persistentes. A possibilidade de interagir com um avatar que encarna a voz perturbadora permite testar respostas mais assertivas em ambiente controlado, o que poderá traduzir-se em maior confiança no dia a dia.

Imagem: tecmundo.com.br
Apesar dos resultados promissores, os investigadores alertam para a necessidade de formar equipas especializadas e de selecionar criteriosamente os candidatos à terapia, tendo em conta histórico clínico, tolerância a estímulos visuais e risco de descompensação. Também recomendam estudos adicionais para apurar a duração ideal das sessões, o número de reforços necessários e o eventual impacto em outras dimensões sintomáticas, como ansiedade ou depressão associadas.
Próximos passos da investigação
Com os dispositivos de realidade virtual a tornarem-se mais acessíveis, abre-se espaço para ensaios multicêntricos que possam confirmar a eficácia do método em diferentes sistemas de saúde. O Grupo VIRTU planeia acompanhar os participantes durante períodos mais longos e testar variações do protocolo, incluindo ajustes na aparência dos avatares e na condução dos diálogos.
Para os especialistas, a Challenge-VRT simboliza uma nova geração de terapias digitais, combinando tecnologia imersiva e psicologia clínica para abordar sintomas complexos. A curto prazo, a prioridade passa por definir diretrizes de segurança e integrar a técnica em serviços de psiquiatria que já dispõem de recursos humanos para terapias cognitivo-comportamentais.
Sendo necessário confirmar a reproducibilidade dos resultados, o estudo dinamarquês posiciona a realidade virtual como opção viável para um dos sintomas mais incapacitantes da esquizofrenia, oferecendo aos doentes uma estratégia complementar ao arsenal farmacológico existente.

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